Escrever é um ato de resistência
Colocar as ideias no papel (ou na tela do computador) é preciso!
No final do ano de 2015 eu descobri um site interessante e com uma proposta ousada. Era o 750words.com. A ideia era todos os dias escrever pelo menos 750 palavras. Todos. Os. Dias.
Se escrever 750 palavras (uma página e meia aproximadamente) já é difícil, imagina fazer isso todos os dias? E, ao navegar pelo site, descobrir pessoas que escrevem diariamente há anos?
Começar a escrever em um fluxo contínuo, com uma tela em branco e apenas olhando a contagem de palavras na última linha da tela aumentar. E a mensagem te parabenizando quando você completa sua meta diária. Sua meta diária de 750 palavras. Meta que você vence hoje, mas amanhã tem mais.
Me atrevi a arriscar acreditando que só faria no primeiro dia. Consegui por 25 dias seguidos e alguns outros fora de sequência. Foi uma vitória e isso afetou minha vida positivamente. E fui um pouco além, acabei usando essa "obrigação" para compor alguns artigos para publicar em um blog antigo que tinha em outra plataforma. Esses artigos eram disparados em uma newsletter para alunos e outros leitores. Raros comentários ou retornos. E isso nunca foi um problema, pois eu escrevia para mim.
Por ser um dos primeiros usuários do 750 Words acabei ganhando uma conta lifetime, algo que atualmente é difícil de encontrar em meio a inúmeros serviços de assinatura. O serviço ganhou força e vigor e uma segunda versão do sistema foi lançada. Hoje, nesse momento, aliás, estou usando-o para escrever esse texto. Minhas mensagens antigas (a maioria artigos, mas alguns devaneios também) continuam ali salvos no serviço.
E o efeito positivo disso em minha vida é que aquele mês de janeiro de 2016 que me dediquei àquela tarefa sísifica culminaram no meu primeiro livro não acadêmico, publicado em 2020, quatro anos depois. Já tinha organizado outros durante a Pós-graduação, mas esse foi algo não técnico e/ou científico.
E outro livro veio depois. Outros também vieram. E breve chegará mais um. Algo que aprendi me atrevendo como escritor amador que sempre comentamos do "meu mais recente livro" e nunca do "meu último livro". Palavras tem poder :)
Escrever é um ato de resistência.
Explico: somos estimulados e controlados a criar somente dentro de "silos digitais", que são ambientes cercados que nos persuadem a buscar cliques, likes, comentários, etc. São lugares sem formato aberto de intercâmbio de informações e que dificultam qualquer tentativa de interação com outros espaços. Você já tentou colocar um link em um post naquela rede social de fotos? Pois é, não tem jeito. Já parou para pensar que você luta para conseguir "seguidores", divulga sempre a marca da rede social, "vive" dentro dela horas e horas por semana e no momento que posta alguma coisa é controlado como acontece essa entrega de informação?
E nós normalizamos o "é como o algoritmo funciona".
O Facebook matou os blogs de humor no ano em que se difundiu no Brasil. Primeiro incentivando a migrarem conteúdo para dentro dele. Depois estimulando compartilhamento de dentro dele e dificultando a saída de lá. E por último controlando o que e quantas vezes determinada postagem é exibida.
O FOMO (Fear of Missing Out), ou o medo de perder o que está acontecendo, em uma tradução livre, nos instiga a entrar mais e mais nas redes e buscar estar a par do que está acontecendo. Acessamos para descobrir que o FOMO não passa. Não importa o tempo que passemos rolando as imagens, notícias e postagens.
Ah, saudades de quando a moda era postar foto do prato de comida. Hoje a mídia mudou. Tudo é vídeo. Todas as redes focam em vídeos. Achamos normal alguém postar um vídeo de 10 minutos para te ensinar algo que dois ou três parágrafos escritos seriam suficientes. Mas as redes preferem e incentivam vídeos. Vídeos geram maior engajamento. E isso reflete em mais tempo no site e mais consumo.
Escrever é um ato de resistência.
Depois disso tudo, perceber como blogs ainda insistem e persistem em continuar e conceitos como "Slow Web" serem discutidos e grupos de pessoas se organizarem para uma Resistência às Big techs dá, sim, satisfação. Pode parecer óbvio, mas ter o poder de controlar o que escreve, como escreve e sem a obrigação de pensar se isso precisa ser criado com artificialidade suficiente para ganhar curtidas é uma libertação.
Não. Você não precisa apagar suas redes sociais se não quiser (mas, segundo o autor Jaron Lanier em seu livro Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais, você deveria fazer isso). Porém, pode também optar por criar e construir fora delas.
Escrever é um ato de resistência.
É uma forma de você fazer um "dump cerebral". Para quem não conhece o termo dump, é uma forma de copiar todo o conteúdo de um banco de dados (por exemplo) em um formato para cópia de segurança. Aqui eu faço uma licença poética e chamo de "dump cerebral" o ato de você tirar da sua cabeças ideias e coisas que estão ali incomodando e escrevê-las.
Quando você precisa escrever, você se vê obrigado a organizar os pensamentos, encadear as ideias e colocá-las de forma lógica, linear ou não, no papel ou em qualquer outra mídia. E isso te ajuda a limpar a mente, abrir espaços para outros pensamentos :)
E se puder fazer isso ajudando outras pessoas, ensinando o que sabe e/ou gerando reflexão, é ainda melhor. Talvez a mudança de perspectiva seja sair de simples consumidores para criadores. E criar é Arte.
Arte é um ato de Resistência.
Boa, mestre! O ato de escrever é prazeroso e libertador, mas, é necessária uma dose extra de paciência e foco, não somente para lidar com as distrações e também, com o algorítimo que muitas vezes tolhe a criatividade devido aos critérios e padrões a serem seguidos nas plataformas. No mais, vamos perseverar, apontar o lápis e deixar a imaginação e o coração nos guiar no enebriante exercício da escrita.